segunda-feira, 28 de janeiro de 2013

Catamarã

Hoje fui trabalhar de barco. Genial. Saí de casa de carro, estacionei no cais do porto (estacionamento incluído no valor do bilhete, me disse o guarda). Peguei o catamarã, pontualmente às 7h. Desembarquei em Guaíba, tomei um ônibus na porta da estação de desembarque e desci exatamente na porta do hospital onde trabalho. Entrei na minha sala exatamente às 7 horas e 28 minutos! Na volta, o inverso. Peguei o barco das 19:30 e cheguei dentro de casa pouco depois das oito da noite. Paisagem deslumbrante, internet à bordo, televisão, ambiente fechado com janelões para ver a vista, climatizado. Só senti falta de um deck superior, para sentir o vento no rosto. Impossível, por razões de segurança, informou-me o comandante. Extremamente civilizado, isso de ir ao trabalho de barco. Não é qualquer cidade que oferece esta possibilidade. Fico chocada com o tamanho do rio (ou lago, não entrarei nesta polêmica) que banha nossa bela cidade. E, durante anos, o transporte fluvial foi solenemente ignorado. À exceção de um ou outro barco para turistas, que dá um lindo passeio por entre as ilhas e retorna exatamente para o mesmo lugar. Não pode ser considerado exatamente transporte.
O catamarã é outro caso. Também é um lindo passeio, mas tem por objetivo primordial levar pessoas de um lugar a outro (no caso, Porto Alegre-Guaíba). O trajeto implora uma estação na zona sul de Porto Alegre, antes de cruzar para Guaíba, já que o canal de navegação passa junto à margem porto-alegrense e só cruza para chegar em Guaíba. Pode ser caro, mas não deixa de ser uma opção ao trânsito caótico da metrópole.
Muito bom descobrir que existem opções viáveis ao transporte rodoviário. Há várias teorias sobre o porque de andarmos somente de carro e ônibus. Teorias conspiratórias, algumas mais ou menos plausíveis. Envolvem desde o governo de Juscelino, passando por uma suposta máfia das companhias de ônibus e de transporte rodoviário de carga.
Mas o catamarã me lembra (e, quem sabe, a mais gente) que há estradas asfaltadas e também hidrovias e (já pensou?) ferrovias! Abre uma esperança e um precedente. Foi instalado um serviço bom, prático, com um preço compatível e que não parece sanguessuga (não cobra extra pelo estacionamento, por exemplo).
Sensacional. Fora a vista, de tirar o fôlego!
***
Ouço o sujeito do corpo de bombeiros a explicar que, segundo a norma brasileira, a casa noturna não apresentava irregularidades significativas. Pois então, tenho uma novidade. A norma brasileira é ruim, não presta. E temos o vácuo de todas essas pessoas para provar. Será que é possível mudar a norma antes que mais alguém morra? 
Houve incêndios catastróficos em casas noturnas nos Estado Unidos, na China e na Argentina. Todos nos últimos dez anos. Todos com mais de 100 mortos. Todos iniciados com sinalizadores ou shows pirotécnicos. Ninguém viu essas notícias antes? 

terça-feira, 15 de janeiro de 2013

Fantasmas

Minha vidinha privada sofreu reviravoltas nos últimos meses. Primeiro troquei de empregador (mas não de emprego), depois troquei de emprego. Agora, estou prestes a trocar de casa. Estou comprando a casa ancestral da família. Ancestral desde 1942. Levei as meninas para vê-la:
 -Mas, mamy, é a casa da Bisa! Nós vamos morar na casa da Bisa? Essa casa nova é bem velha, né?
Não imaginei que ela fosse lembrar. Fazia mais de um ano que não ia lá. Expliquei a ela que a Bisa estava no céu, que não precisava mais da casa.
- O papai e a mamãe vão comprar essa casa e trazer todas as nossas coisas para cá - disse a ela.
-  Mas a Bisa não está no céu, porque ela foi no meu quarto ontem.
Senti um arrepio. Ontem é um conceito amplo para a Luísa, quer dizer qualquer momento passado. Fiquei a imaginar se ela sonhou com a Bisa ou se realmente a avistou. Não sei no que acredito, mas não desacredito mais nada. Disse à minha filha que a Bisa poderia ir no quarto dela, sem problemas, mas que ela iria dormir no céu. Contei que eu achava que ela iria ficar feliz de a gente ir morar na casa que foi dela e do Biso.
Após este pequeno colóquio, ficou brincando um pouco no pátio e imaginando de que cor vamos pintar a parede do quarto novo.
O outro arrepio me veio quando Joana, que tinha dois meses quando a Wó se foi, apontou efusivamente para o porta-retrato de cima do piano:
- Bi, bi, bi - ela mostrava a foto da Bisa.
Eu nunca mostrei a ela as fotos de cima do piano. Nunca nomeei aquelas pessoas. Em seguida, ela apontou para a foto do meu pai e disse:
- O vovô? O vovô?
- Sim, Joana, é o vovô Gabriel e a Bisa.
Fantasmas adoráveis que parecem frequentar a minha casa. Como elas não sabem que não existem, não têm nenhum problema em compartilhar suas (possíveis) experiências mediúnicas.
Penso bastante nos meus queridos desencarnados. Me pergunto se é patológico, mas na verdade, a tristeza da perda, o luto em si, já passou. Sobrou uma saudade imensa, mas que não dói. Uma vontadezinha de estar junto com eles. Mas nada que me faça chorar (quase nunca). Quase sempre, ao contrário, me faz sorrir.
Eu sonho com eles, com bastante frequência. Acho que é também uma forma de convívio. Me acordo com a sensação de que realmente estivemos juntos. O último, anteontem, envolvia a Wó e meu tio, falecido poucos dias antes dela, vítima de um câncer. Muito vívido, o sonho. Ele me dizia sobre os erros que os médicos cometem ao tentarem usar a Classificação Internacional de Doenças.
- Médico não sabe classificar. Tá sempre com pressa, bota qualquer número. Tem que haver um técnico treinado para isso.
O tio era médico sanitarista, expert em classificação de doenças. Ouvi dele esse discurso muitas vezes em vida. No final da conversa, ele fez um comentário sobre o gramado da Arena do Grêmio (outra paixão dele). Muito atual, considerando que o estádio não estava pronto da última vez que veio a Porto Alegre, pouco antes de morrer. A Wó respondeu que ele tinha quer ter mais paciência, o verão estava seco e a grama estava recém plantada. E disse uma frase muito terrena que ela sempre usava:
- Calma e paciência!
Acordei do sonho com a nítida sensação de ter estado com eles. Muito nítida. De certa forma, eu realmente estive. Ao menos com minhas memórias inconscientes deles e meus desejos muito conscientes de que todos esses fantasmas ainda fossem de carne e osso. Ou então...

terça-feira, 8 de janeiro de 2013

Menininhas

Finalmente, passadas todas as festas, a falta de internet do Palácio de Verão e o retorno à rotina do domicílio, consigo sentar e escrever. É um exercício, de verdade. E estou fora de forma. É difícil escrever quando faz tempo que a gente não escreve. Não flui. 

Notícias das menininhas: Luísa, articuladíssima, me fala sobre os diálogos que ela tem com seus personagens favoritos:
- Eu converso com o (Smurf) Gênio e o Papai Smurf. E a Mônica e o Cascão estão comendo agola. Esses personagens estão todos aqui na sala! O Mickey foi dormir, ele não está aqui.
Personagens! Com três anos, ela me dá explicações sobre personagens. Chego quase a enxergar smurfs do tamanho de três maçãs correndo no meio da sala, enquanto desviam de uma coelhada do Sansão no Cebolinha. Mais ou menos como Julie Andrews deve ter se sentido ao filmar a cena dos pinguins de Mary Poppins. Eles estão ali. Só eu que não consigo vê-los naquele momento. 

Joaninha, 17 meses, aprende umas cinco palavras novas por dia:
Au-au para os bichos implumes, cocó para os plumados;
Ali, diz ela quando perguntada sobre alguma coisa ou alguém fora do seu campo de visão, enquanto aponta com o dedinho;
Aqui, quando o objeto está à vista;
Sai;
Pé (quer dizer o próprio pé ou que quer descer do colo e ficar de pé);
Mão;
É meu;
Me dá;
Cô (quer dizer suco);
Cocô (ela avisa quando faz);
Xixi (ela não sabe bem o que é, mas sabe que tem alguma coisa a ver com fralda e pinico) 
Água, que pronuncia com perfeição;
Mais, uma da suas palavras preferidas, principalmente quando se trata de comer;
Bô (acabou);
Naná (dormir);
Mamá;
Mamãe e papai, também pronunciados perfeitamente;
Carro;
Fora todas as outras de que eu não me lembro.
No espaço de duas ou três semanas, ela começou a falar. E a cantar. A plenos pulmões. Esse negócio de não dormir estraga um pouco a experiência, mas duvido que haja qualquer situação mais fascinante do que ver um bebê completamente inútil (embora muito fofo) transformar-se em uma pessoa que fala, por exemplo, sobre personagens!
É lugar comum, mas o Vinícius tinha razão:
"(...) Que coisa louca, que coisa linda que os filhos são"