segunda-feira, 5 de novembro de 2012

Sete dias

Minha cabeça fervilha de ideias neste cinco de novembro. Dia da cultura, do Rui Barbosa e desta que vos escreve. Dei-me de presente duas horas sozinha na Feira do Livro (já mencionei isso antes, a Feira pra mim é melhor que Natal). Livros, livros e livros. Muitas ideias por todos os lados. Cercada de letras. Novidades, velharias, saldos de R$1,00. O final de tarde mais perfeito que alguém já imaginou nesta cidade. O céu azul com umas três nuvens. Uma brisa suave e refrescante. Os jacarandás com muitas flores, mas com um início de primavera verde que brota dos galhos. No final da caminhada na Praça da Alfândega, depois de chegar do Cais do Porto, sentei e comi morangos com creme de chocolate. Uma orquestra tocava uma valsa que me pareceu Chostakovich. Dificilmente o paraíso será melhor que isso. Na subida da Rua da Ladeira, já no caminho para casa, surgiu a metade da cúpula da Catedral, com sua cor marron-cobre a fazer contraste com o extremo azul do céu, a outra metade encoberta pelo cinza-preto do Tribunal de Justiça.
(Fui até o cais, na área infantil, só para ver o rio de pertinho. Recusei-me peremptoriamente a folhear qualquer livro que tivesse algum "pop-up", que emitisse som, ou que se transformasse em qualquer coisa remotamente peluda. Foi um final de tarde de completo egoísmo).
Saí, na verdade, com poucos livros na sacola. Dois do inspetor Maigret, que ainda não tinha, um inédito do Petit Nicolas, e um livro sobre o Fusca. Ganhei mais livros de presente de aniversário. Obras de ficção deliciosas que não sei quando conseguirei ler. Acho que vou voltar a ir para o trabalho de lotação, pois conseguia ler ao menos umas três páginas em cada trecho. Fora a parte politicamente correta.
Minha maior fantasia era que o mundo parasse para todos os outros. Congelasse durante, digamos, sete dias. Para todos, exceto eu. Já pensou? Sete dias para ler todos os livros que já comprei? Toda aquela montanha de conhecimento e prazer que espera uma pausa sem a sonolência perene? Um momento em que não haja a culpa de não estar dando a devida atenção para alguém. Sete dias de completo egoísmo literário. Na minha fantasia, eu não precisaria dormir, estaria sempre repousada e feliz, com um semblante tranquilo. Teria sete dias para ler. Somente ler seria necessário. Não haveria internet, televisão, celular. Comida pronta, casa organizada, nada para limpar ou fazer. Ninguém para atender. Nenhuma tarefa. Todos dormiriam em segurança e eu saberia que iriam acordar dentro de sete dias. Sem preocupações. Para os que dormissem, só teria se passado uma noite. Mas eu teria ganhado montanhas de conhecimento. Quem sabe eu poderia botar o sono em dia dormindo na fantasia de outra pessoa.
Falta meia hora para terminar o meu aniversário. Joana já deu o ar da graça, o marido ainda circula pela casa. Por enquanto, meu desejo é apenas um desejo. Tenho a esperança de que amanhã o rádio-relógio não despertará. O barulho dos carros terá cessado. Os cães dormirão, assim como os flanelinhas, os sabiás e outros habitantes barulhentos do meu bairro. Eu serei despertada pelo silêncio completo. E então, passado o susto e certa de que, com todos a dormir não preciso ir trabalhar, chegarei na minha estante e pegarei cada volume empoeirado e degustarei cada frase. A cada duas horas, poderia levantar, esticar as pernas, ouvir uma música, fazer alongamento. E de volta à leitura.
Não imagino nada trágico, como uma série de TV chamada "O Mundo Sem Ninguém", que mostra imagens fantasmagóricas de Chernobyl para ilustrar o que ocorre quando os homens vão-se embora. Não haveria Torre Eiffel desabada nem represas desassistidas. O mundo simplesmente estaria parado. E as pessoas tranquilamente adormecidas.
Pensando bem, acho que gostaria de várias temporadas fantásticas de mundo parado. Uma para ler, outra para organizar minha casa, mais uma para terminar todos os trabalhos manuais que já comecei e nunca acabei (acho que essa temporada teria que durar mais de uma semana). Não daria para ser tudo junto, pois sentiria, ao fim e ao cabo, muita falta das pessoas. Nunca tive vocação para a solidão. Poderia ser uma semana por ano. Já pensou?

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