segunda-feira, 11 de junho de 2012

Celular

Esqueci meu celular no posto hoje. E só agora descobri a quantidade de tempo que ele me toma. Tenho saudade do tempo em que um celular era apenas um telefone que a gente carrega de um lado para outro. Agora é uma central de comunicações e entretenimento. Acho que o que eu menos faço com aquele aparelho é falar telefone. Provavelmente o que eu mais faço é olhar as horas. Depois, mandar mensagens, olhar o twitter, ler e-mail, jogar paciência e, por último e muito depois, falar ao telefone. Ainda lembro quando, no ano 2000, durante uma temporada em Lausanne, na Suíça, fiquei muito curiosa sobre os aparelhos dos meus amigos europeus, que mandavam e recebiam mensagens de texto. Naquela época, meu enorme aparelho analógico Nokia limitava-se a fazer e receber ligações. Assim mesmo no Brasil, pois roaming internacional era ficção científica. Para falar celular na Suíça, eu teria que comprar um aparelho lá e habilitá-lo. Na época, o preço era proibitivo. Deixei meu celular no Brasil e fiquei desconectada por 5 semanas. De vez em quando, ia até a agência de correio perto da Place St. François, onde havia uns computadores com acesso gratuito à internet para olhar meu e-mail. E era isso. A médiateque da escola do Eurocentre onde estudava só abria sites en Français.
Passados 12 anos, o mundo digital evoluiu. Divirto-me sempre que assisto àquele filme De Volta Para o Futuro 2, em que eles viajam a 2015. Há carros voadores (não os imagino por aí num futuro próximo) e a grande revolução das telecomunicações são umas televisões enormes com muitos canais ao mesmo tempo que atendem ligações telefônicas. Em casa. Internet, nem pensar.
Adoro como as visões de futuro são invariavelmente exacerbações do presente do autor. Julio Verne escreveu um livro genial, publicado postumamente, chamado Paris No Século XX. Escrito em 1868, ele ambientava seu romance em 1968. Nada de revoltas de universitários. Nada de rock 'n roll. A música do século XX seria dodecafônica. Não me recordo de detalhes do livro, que li há uns 20 anos. Nem sei onde foi parar. Mas o futuro do século XIX era baseado no racionalismo científico levado às últimas consequências. Assim como as previsões sombrias de 1984, publicado em 1949, revelavam o temor de que as tendências totalitárias vigentes tornassem-se a regra num futuro não tão distante.
Acho que ninguém podia supor as redes sociais e aparelhos celulares diminutos e com múltiplas funções. Leonardo da Vinci poderia supor o helicóptero. Julio Verne pode supor a viagem à lua (ainda que seu astronauta usasse fraque e cartola). Mas nosso presente lida com o que não há. Lida com o virtual. Não são cartas que materializam-se instantaneamente no outro lado do mundo. Elas simplesmente não existem como objetos. São ideias que pairam em uma rede virtual transmitida via satélite, ou cabo de fibra óptica, para o mundo. Eu, hoje, não faço a menor ideia como funciona. É mágica. Eu escrevo aqui e você pode ler lá na Rússia. Instantaneamente. Imagina uma pessoa para quem um computador era uma máquina que contava. Ou que computava coisas, dados, números. Não se podia escrever poesia nos computadores originais. Apenas contar coisas, pessoas, valores. Poesia era escrita com papel e tinta.
As comunicações mudaram, os remédios mudaram, o mundo mudou. Mas Luísa ainda tosse, a despeito de todo esse progresso. Sento com ela no colo, pois a tosse persiste mesmo depois de medicada. E insônia de mãe de criança que tosse continua a mesma há séculos. Algumas coisas não mudam.

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