quinta-feira, 8 de março de 2012

Aviação

Tema recorrente neste blog, a saudade dos meus avós apertou no dia de ontem. Atendi um paciente que me lembrou o vô. O vô das minhas memórias de infância, seus 70 e poucos anos. Que dirigia seu grande Opala verde, apesar do medo de toda a família. Que ia ao "City" (referia-se ao Citybank) a pé e voltava de ônibus, sempre com a sua boina basca.
Pois o tal senhor, 75 anos, integrara o Batalhão de Suez. Contou-me, orgulhoso, dos lugares que vira na juventude. Disse que alistara-se para poder viajar. E foi a única vez em que viajou para o exterior (ele me disse, entre risos, que a fronteira Jaguarão/Rio Branco "não conta")
Despertou as lembranças da viagem da Europa do vô, que ele contava para qualquer visita que mencionasse uma viagem, até para São Leopoldo. Seu José contou-me sobre o Batalhão de Suez, atrasando todas as demais consultas da manhã. Mas escutei com todo o carinho, como se fosse o vô.
À noite, enquanto fazia as compras da casa, deparei-me com uma lata de manteiga Aviação. Quase a me chamar. Imediatamente, senti o cheiro do café forte que a Wó passava para a janta, que o vô misturava com leite e adoçava com uma colherzinha de mel. Senti o gosto do miolinho do pão branco que ele nos dava, pois tinha "muito triglicerídio". Comia a casca com käs schmier, que ele misturava com a nata da sua xícara de leite. (Confesso que achava meio nojento aquilo). Vi sua imagem sentado à mesa da copa, recostado na cadeira, a pancinha cheia de farelo de pão, que ele espanava com a mão. E lembrei dele molhando a mão com a água da jarra da geladeira no fim da refeição. E depois, pegava um biscoito recheado de chocolate, que era quadrado. Ele abria o pacote com uma faca, formando uma tampinha com o primeiro biscoito do pacote dentro dela. Claro que sempre nos dava aquele primeiro biscoito que, por qualquer razão, era melhor que todos os outros do pacote.
Tinha manteiga em casa, não estava na lista de compras. E havia uma latinha pequena da manteiga. Mas eu precisava da lata grande, a mesma que tinha no café da noite da casa dos meus avós. Custou uma fortuna.
Cheguei em casa e abri minha lata de manteiga Aviação. Peguei um pãozinho novo, fresquinho, e saboreei em sua homenagem. Teve gosto de saudade. Mas foi uma delícia. Valeu cada centavo.

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